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Aluno de autoescola denuncia quadrilha no Detran-PI por propina de R$ 400

“Não entendia porque eu estava sendo sempre reprovada. O último instrutor disse que, enquanto eu não pagasse o valor de R$ 300,00, eles continuariam reprovando a mim e a minha irmã [também aluna e vítima da ação]”

em 24 de maio de 2017

Não é incomum ouvir relatos de corrupção em processos de retirada da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) envolvendo autoescolas e o Detran. No Piauí, muitos confirmam que tal prática parece ser mais grave e frequente, mas nada comprovado até um candidato à emissão do documento denunciar uma cobrança de suborno no dia em que foi fazer o teste prático no departamento, com sede em Teresina. Há pouco mais de um mês, o primeiro indício foi constatado. Já na última segunda-feira (22/05), provas foram repassadas ao OitoMeia.

Para entender melhor, o primeiro relato à reportagem aconteceu no dia 20 de abril. Dias antes, a vítima, que preferiu manter a identidade preservada por temer retaliações, afirmou que foi induzida a errar durante o exame prático do Departamento de Trânsito do Piauí (Detran-Pi). Na ocasião, uma propina acordada entre o instrutor e os dois examinadores em questão não foi paga. Ao sair do local, comentou que estava sendo extorquida, mas alguém disse que a mesma deveria calar-se ou a “coisa ficaria pior”.

Sem a possibilidade de aprovação, o aluno cedeu às chantagens intermediadas pelo instrutor e resolveu pagar o valor de R$ 400,00, na esperança de coletar provas que acusassem a quadrilha. Cópias de conversas do WhatsApp foram feitas e um áudio foi gravado (secretamente) para explicar detalhes da ação criminosa. A partir de então, na noite da última segunda-feira (22/05), o candidato voltou a denunciar o grupo.

“Não entendia porque eu estava sendo sempre reprovada. O último instrutor disse que, enquanto eu não pagasse o valor de R$ 300,00, eles continuariam reprovando a mim e a minha irmã [também aluna e vítima da ação]”, desabafa a denunciante ao OitoMeia. O instrutor em questão foi identificado como Irane Gomes da Silva, integrante do quadro de funcionários de uma grande autoescola de Teresina, localizada na Avenida Dom Severino, zona Leste da capital.

INSTRUTOR AMEAÇA

“Coagidas, nos vimos sem saída. Então, por medo de perder o processo, já prestes a vencer, por já estarmos cientes de que teríamos que pagar outro reteste [segunda oportunidade no exame] e por medo de que ninguém acreditasse em nós, vimo-nos obrigadas a pagar o que eles estavam extorquindo. Enquanto eu não pagasse, eles continuariam me reprovando. No último teste, eu não fazia nada de errado, mas eles me induziam e faziam-me errar, sem informar o que eu estava errando”, continua a vítima.

O drama não para por aí. Ao que tudo indica, as vítimas são alvos de ameaças do instrutor. Segundo a fonte, há a cobrança do restante do valor (R$ 100,00) com agressividade ou, caso contrário, nenhum dos alunos da referida autoescola será aprovado no próximo teste, o que fará com sejam habilitados para a Categoria A (motocicleta). Ambos, após cada um pagar R$ 300,00 de propina, tornaram-se habilitados para a Categoria B (carro). “Ele está ameaçando e coagindo a gente. Se o dinheiro não for dado, seremos reprovados na moto também”, diz.

Nos prints repassados à reportagem, o tom de ameaça vindo de Irane é nítido (Reprodução WhatsApp OitoMeia)

Nos prints repassados à reportagem, o tom de ameaça vindo de Irane é nítido. “Se vocês [alunos] vão fazer moto, é melhor se limpar [concluir o pagamento] logo com eles [examinadores]”, diz em parte da conversa. “Hoje, no Detran, eles perguntaram que dia vou levar [o dinheiro]. Falei que ia falar com você”, continua em outro trecho. “Tá faltando R$ 100,00 teu e R$ 100,00 da tua irmã”, insiste com a cobrança.

Alunos citados nesta matéria pagou cerca de R$ 600,00 para conseguir retirar a CNH (Reprodução WhatsApp OitoMeia)

“Eles [examinadores do Detran] estavam querendo o telefone de vocês, mas eu estou falando que não tenho. Sei que vão ficar ligando direto, pois são muito azilados [viciados]. Você andou com eles no carro e vão fazer de tudo para dar certo”, conclui o suspeito na conversa pelo WhatsApp. Até então, os alunos citados nesta matéria pagou cerca de R$ 600,00 para conseguir retirar a CNH, dinheiro distribuído entre o instrutor, os examinadores e uma suposta mulher [receptadora do valor] que vende lanches próximo ao local do exame prático.

“SEI ONDE VOCÊS MORAM”

Um áudio feito no dia do reteste foi repassado ao OitoMeia. O diálogo entre uma das vítimas e Irane mostra detalhes da negociação. “Esse bem aí é R$ 450,00 [inaudível]… Aí eu falei com ele [examinador do Detran] para você me dar os R$ 150,00  na próxima semana [conforme transcrição da vítima]”, inicia o instrutor. “Na verdade, eu tenho R$ 300,00, mas os outros R$ 50,00 é para eu voltar para casa”, responde a fonte. Devido a outros ruídos, a qualidade do áudio ficou comprometida, impedindo a identificação de mais trechos.

“Se tivesse me avisado naquele dia [dia do primeiro teste prático], eu teria vindo preparado [ao suborno]. É que, na verdade, eu não sabia, né?”, instiga a vítima alguma confissão do suspeito. “Naquele dia mesmo, já? Tu pegou aula comigo, não foi?”, confirma em outro trecho da negociação. Conforme pedido da vítima, o áudio não será disponibilizado. À reportagem, ela confessou que o instrutor teria dito: “Eu sei onde vocês moram”.

Outro candidato, também aluno da mesma autoescola, passou por situação semelhante e confirmou ao OitoMeia sobre uma tentativa de suborno no dia da avaliação prática dele, ocorrida semana passada. “No decorrer do percurso, eles vinham conversando e falando que um aluno queria compra-los. A avaliadora, atrás, somente ria. Sei que não errei, mas mandaram eu repetir o percurso porque eu tinha avançado uma via preferencial [na teoria é reprovação, de cara]. Como, eu já estando ‘reprovado’, mandam eu repetir o percurso e falando sempre de suborno?”, questiona o aluno.

AUTOESCOLA FALA EM DEMISSÃO

O OitoMeia conversou com Valéria Carvalho, dona do estabelecimento. Há o lamento da presença desse tipo de funcionário em várias instituições do Piauí, deixando claro que tais ilícitos são recorrentes, segundo ela. “Nós não concordamos com nada disso, de nenhum instrutor pedir dinheiro para aluno para dar para ‘x’ ou para ‘y’. Recomendamos que os alunos denunciem tanto na secretaria da autoescola como na própria delegacia ou Ministério Público, além de fazer a denúncia ao Detran.”, defende.

Em outro momento, Valéria destaca que não há nenhuma ligação da autoescola com a cobrança de propinas. “Isso já é uma febre dentro do meio. Acontece em todas as autoescolas. Todo mundo sabe disso, inclusive a direção do Detran. A direção da autoescola não concorda que nenhum aluno pague dinheiro para instrutor ou examinador. Nesse tipo de denúncia, não há nem como se pensar em sindicância, é demissão, com certeza”, constata.

Detran orienta o candidato vítima de cobranças de propina a formalizar uma denúncia junto ao órgão para que o caso seja investigado pela Secretaria de Segurança Pública do Piauí (Foto: Divulgação)

Em resposta, o Detran orienta o candidato vítima de cobranças de propina a formalizar uma denúncia junto ao órgão para que o caso seja investigado pela Secretaria de Segurança Pública do Piauí (SSP-PI). Após as irregularidades concluídas, todos envolvidos, caso haja a comprovação nos ilícitos, poderão ser responsabilizados. As informações são da assessoria de imprensa do órgão, repassadas ao OitoMeia.

A reportagem conversou com Irane Gomes da Silva, mas o instrutor não quis se pronunciar sobre as acusações. A vítima não soube identificar os examinadores do Detran, mas informou que vai formalizar uma denúncia junto às autoridades policiais.

Fonte: OitoMeia

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